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Quem nunca sintonizou na programação vespertina do SBT e sofreu com a voz de taquara rachada da Aracy da TopTherm? Tentando lucrar com suplementos de ômega 3, ela prega: "é um alimento do cérebro, do coração!". O marketing excessivo faz parecer pura história de pescador que o tal ômega deixe o cérebro mais afiado.
Afinal de contas, o ômega 3 funciona? Quem suplementá-lo irá ter algum benefício notável na memória, humor ou concentração? Depende de para quem você pergunta.
Ao consultar os usuários desse suplemento, talvez a maioria lhe diga que não "sentiu" nenhum efeito - logo, ele não funciona. Mas, ao consultar a literatura científica, irá encontrar muitas evidências que o uso crônico de ômega 3, em pessoas jovens e saudáveis, melhora significativamente alguns parâmetros cognitivos, comparado a um placebo. Por que essa diferença? Vamos entender...
O que a ciência diz sobre o ômega 3
Estudo com militares americanos mostrou que aqueles com maiores concentrações de ômega 3 no sangue - que refletem as do cérebro - possuem melhores funções executivas (habilidades de foco, planejamento, tomada de decisões...). Para os autores, essa associação indica que "um aumento na ingestão de ômega 3 pode melhorar a performance neurocognitiva".
Similarmente, em adolescentes, o nível de ômega 3 é diretamente proporcional a capacidade de controlar impulsos e processar informações. Estudantes com maior ingestão de peixe, fonte importante de ômega 3, possuem notas maiores comparado aos colegas que nunca ou raramente comem peixe (mesmo levando em conta outros fatores, como renda).
Será que essas associações seriam coincidência? Para chegar a uma conclusão, temos que olhar para estudos que administraram ômega 3 (na forma de óleo de peixe) ou placebo a jovens saudáveis e que examinaram o desempenho deles antes e depois dessas intervenções. Não todos - mas muitos notaram benefícios.
Num ensaio clínico, a suplementação de DHA (um dos tipos de ômega 3) por seis meses aumentou de maneira significativa a capacidade de memorização de jovens; outro estudo confirmou esse achado. Em estudantes de medicina, o uso de ômega 3 rico em EPA exerceu efeito anti-inflamatório e reduziu a sensação de ansiedade em 20%, após 12 semanas. Após 35 dias, o ômega 3 também produziu efeito ansiolítico, além de melhorar a disposição e o desempenho em testes que exigem atenção.
E por que o ômega 3 "não faz efeito", para quem usa
Eu ouso dizer que se fôssemos questionar os jovens que participaram dos estudos acima, eles diriam que o ômega 3 é inútil. Sim, mesmo com comprovação estatística de que eles estavam com uma memória mais afiada, mais serenos e focados. E o porquê disso?
Quem busca ômega 3 para "ficar mais inteligente" tende a se decepcionar porque, subjetivamente, não discriminam algum efeito imediato. Esquecem o óbvio: o ômega 3 é um nutriente - o mesmo ômega das cápsulas de óleo de peixe está também, em quantidades às vezes maiores, em sardinhas e no salmão. E ninguém espera se sentir um Einstein ou o protagonista de Limitless (Sem Limites) logo após comer uma sardinha.
O ômega 3 não te faz se sentir assim. Logo, "não funciona" |
O problema é que as pessoas desejam se sentir assim. Isso explica porque anfetaminas e metilfenidato (Ritalina) são, popularmente, vistos como drogas da inteligência. Após uma única dose, elas deixam seu usuário mais alerta, cheio de energia e motivação. Tal euforia química é interpretada como "uau! Em meia hora, já ganhei mais 30 pontos de QI" - e a droga, subjetivamente, é julgada como eficaz. Mesmo que alguns estudos demonstrem até que elas podem piorar alguns parâmetros cognitivos em pessoas saudáveis - para não citar os efeitos adversos.
O mesmo problema se dá para outros suplementos nootrópicos: pode haver evidências de que promovem benefícios significativos, medidos por testes cognitivos sensíveis e padronizados, realizados em laboratório. Mas, como não causam alterações abruptas no humor ou comportamento - que são utilizadas para julgar eficácia - então são considerados inúteis.
O mesmo problema se dá para outros suplementos nootrópicos: pode haver evidências de que promovem benefícios significativos, medidos por testes cognitivos sensíveis e padronizados, realizados em laboratório. Mas, como não causam alterações abruptas no humor ou comportamento - que são utilizadas para julgar eficácia - então são considerados inúteis.
Os estudos só demonstram benefícios com o ômega 3 após semanas ou meses. Não apenas isso contraria o imediatismo de muitos. Mas também, com diferenças que surgem de modo tão gradual, é extremamente difícil perceber tais progressos, a menos que se tenha um diário, e dizer algo como: "ah, claro, lembro perfeitamente que há 6 meses eu conseguia me concentrar menos, era mais ansioso e não tinha uma memória tão boa"
Enxergue o ômega 3 com outros olhos / funções e mecanismos
Elenquei aqui vários artigos que, usando métodos diversos, concluíram que o ômega 3 melhora o humor, memória e concentração em jovens saudáveis. Mas a ciência não é unânime. Outras investigações não encontraram benefício algum em suplementar ômega 3.
O porquê disso? Se você lembrar, eu também incluí estudos mostrando que maiores níveis de ômega 3 no corpo ou dieta rica em peixe estão associados com melhor desempenho intelectual. Os estudos sobre o ômega 3 devem considerar isso - benefícios de suplementação dependem do status inicial de ômega 3 no corpo.
Isso nos leva a um último ponto: ômega 3 não deveria ser um mero luxo, algo super dispensável. É um nutriente vital. O cérebro necessita de ômega 3 para funcionar - não é um capricho. O ômega 3 torna as membranas sinápticas menos rígidas - isso permite que os neurônios se comuniquem com mais facilidade.
Veja acima, por exemplo, a diferença na formação do cérebro de embriões de camundongos quando a mãe tem uma ingestão adequada de ômega 3 (esquerda) ou pobre (direita). A formação de sinapses - as teias de conexões entre neurônios - é precária no último caso.
Além disso, o ômega 3 exerce efeito anti-inflamatório: e inflamação excessiva é uma vilã para a cognição e o humor. Vários estudos apontam a inflamação como um dos fatores que contribuem com doenças psiquiátricas, como a depressão e neurodegenerativas, como o Alzheimer.
Durante a evolução, consumíamos proporções idênticas de ômega 6 (encontrado em alimentos ricos em gordura saturada) e ômega 3. Hoje, nós comemos 20 vezes mais ômega 6 do que ômega 3 numa dieta padrão. O problema? Seu corpo metaboliza o ômega 6 em mediadores pró-inflamatórios; enquanto o ômega 3 é metabolizado em componentes anti-inflamatórios. É de se esperar que tamanho desequilíbrio gere um estado hiper-inflamatório que, entre muitas consequências, detone o cérebro em longo-prazo.
Não creio que a ingestão de ômega 3 de fato melhore a cognição - penso que ela normaliza a cognição, na melhor das hipóteses. Se eu fizesse um estudo com 1000 pessoas severamente desidratadas e, então, lhes desse água, estaria certo concluir que: "água melhora a concentração e energia"?. Da mesma forma, é a deficiência de ômega 3 que é problemática - aqueles com níveis insuficientes estão funcionando abaixo do que seria normal. Para não citar que o link entre consumo de ômega 3 e saúde cardiovascular é extremamente vasto.
A resposta a tudo isso não necessariamente está no óleo de peixe da Aracy ou da farmácia. A propósito, qualidade é um problema que deve ser analisado a parte - mas, em suma, a VitaFor é a marca nacional que se destaca por ter selos internacionais de qualidade, algo extremamente raro).
Para quem tem condições de fazê-lo, uma ingestão mais habitual de peixe já contribui de modo importante com a elevação dos níveis de ômega 3 - além de ter nutrientes a mais. Sardinha em lata, alguém?
Para quem tem condições de fazê-lo, uma ingestão mais habitual de peixe já contribui de modo importante com a elevação dos níveis de ômega 3 - além de ter nutrientes a mais. Sardinha em lata, alguém?
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