terça-feira, 17 de abril de 2018

Creatina na cabeça

Não só para os músculos



A creatina é popular entre os que almejam alguns centímetros a mais de circunferência bicipital. Evidências sugerem que ela não fortifica só os músculos, mas também afia o cérebro.


Vamos deixar isso claro: creatina não é uma droga obscura, feita exclusivamente em laboratório e vendida clandestinamente como anabolizante em lojinhas de suplemento. Tanto que seu próprio corpo já é uma fábrica de creatina. E você também a obtém naturalmente na dieta, em carnes. 

O que se discute, porém, é o seu poder nutracêutico – dosagens maiores de creatina, por suplementação. Elas poderiam promover benefícios tanto na academia quanto nos estudos, segundo pesquisas.

Após a ingestão de creatina em homens saudáveis, nota-se aumento dos seus níveis no cérebro, demonstrando que ela atinge o órgão [1]. Por lá, a creatina atua da mesma maneira que age no músculo em exercício: aumenta a disponibilidade de energia.


Seu cérebro gasta energia para caramba - e essa energia é obtida pela quebra química de uma molécula chamada ATP - adenosina trifosfato. O que a creatina faz é servir como um estoque extra de energia, ajudando a regenerar o ATP quando ele é quebrado. Assim, ela mantém o seu maquinário neurológico funcionando [2]. 

Estudos demonstram que a creatina, em doses adequadas, reduz o cansaço mental e aumenta a velocidade em que o cérebro opera.

Efeitos comprovados

Num deles, cientistas aplicaram a voluntários um longo teste de matemática, que exigia a execução de cálculos repetitivos. Aqueles que haviam usado creatina (8 gramas/dia durante 5 dias) tiveram menos fadiga mental do que aqueles que usaram placebo. Os autores provaram que o cérebro de quem usou creatina consumiu mais oxigênio – sinal de maior gasto e produção energética [3].

Outro estudo não encontrou nenhuma diferença nos resultados de uma bateria de testes cognitivos, entre jovens de 21 anos, que usavam creatina e outros que usavam placebo por seis semanas. Porém, esses autores usaram 0.03 g/kg de creatina (por exemplo, 2.1 g para uma pessoa de 70 kg) [4]. Esses resultados são questionáveis, pois a maioria dos estudos para esse propósito, porém, usou dosagens de 5 gramas para cima.

Vegetarianos, que geralmente apresentam deficiência de creatina na dieta, podem ter maiores benefícios. Por exemplo, o uso de 20 gramas de creatina, durante 5 dias, melhorou a memória de vegetarianos, mas não de onívoros. Porém, uma melhora no tempo de reação – habilidade que depende da velocidade do processamento das informações – foi notada nos dois grupos [5].
 
Também em vegetarianos, o uso de 5 gramas de creatina por dia, durante seis semanas, melhorou muito significativamente desempenho em testes que avaliam inteligência e memória operativa. Essa é uma modalidade de memória que usamos para cálculos e leituras, por exemplo. Tais testes exigiam velocidade de processamento de informações – os autores acreditam que, por haver mais energia disponível (creatina), o desempenho melhorou.

Há também um estudo que demonstrou que um regime de 5 gramas de creatina, 4 vezes ao dia (total de 20 gramas ao dia), em pessoas saudáveis, atenuou os efeitos prejudiciais da privação de sono. Após 24 horas sem dormir, aqueles que usaram creatina tiveram um tempo de reação mais rápido e mais bom humor que os voluntários que estavam usando placebo [7].

Disponibilidade, dosagem e segurança
No Brasil, a Anvisa libera o uso da creatina como suplemento alimentar em dosagens de no máximo 3 gramas por dia.

Estudos encontraram benefícios para a cognição com 5 gramas de creatina por dia (durante seis semanas, pelo menos), tal que essa parece ser a dosagem mínima eficaz para esse fim.

O mais recente boletim da Sociedade Internacional de Nutrição Esportiva, de 2017, declara que a creatina é segura e bem tolerada, em pessoas saudáveis. Segundo o informativo, populações que receberam doses acima de 30 gramas de creatina por dia, durante anos, não tiveram nenhum efeito adverso significativo ou sério [8]. Pacientes com alguma doença renal prévia, porém, não deveriam usar doses maiores que 3-5 gramas por dia, segundo outros autores [9]. De praxe, não recomendo o uso de creatina sem avaliação e autorização do seu médico.

Minha opinião
O mercado de suplementos esportivos é famoso por vender óleo de cobra. Mas não é o caso da creatina, que se consagrou como o suplemento mais eficaz para aumentar a força muscular. Seu uso tão popular para fins atléticos ofusca os seus benéficos ao cérebro, que são atestados por alguns artigos. A creatina serve como uma reserva de energia cerebral. Como o cérebro tem gasolina de sobra no tanque, ele passa a operar numa velocidade maior – demonstrado pela capacidade da creatina em melhorar o tempo de reação, ou seja, acelerar nossa percepção e resposta aos estímulos (visuais, auditivos...). Essa propriedade foi demonstrada repetidamente na literatura. Porém, é difícil dizer se esses efeitos são perceptíveis (“sentidos”) pelo próprio usuário, mesmo que estejam presentes. Ela carece de estudos em longo-prazo para fins de melhora do desempenho cognitivo.

Descubra mais: como melhorar o desempenho do seu cérebro

Confira aqui a segunda edição do meu livro, "Turbine Seu Cérebro". Nele, você descobrirá: 

  • Tudo sobre nootrópicos - substâncias que prometem aumentar a capacidade de concentração, melhorar a memória, humor e raciocínio. Eu coletei relatos de uso e também pesquisei o veredito da ciência sobre a eficácia e segurança de dezenas desses compostos.
  • Estratégias de estilo de vida, como a melhora da qualidade de sono, para melhorar seu desempenho mental.
  • Como os alimentos podem impactar a sua performance cognitiva e seu humor.
  • Tudo isso numa linguagem agradável e acessível e em uma obra impecavelmente ilustrada.

Clique aqui para saber mais!

Referências

Para saber mais:

Nenhum comentário:

Postar um comentário