sexta-feira, 24 de julho de 2015

A história do Piracetam: uma descoberta acidental que revolucionou a Neurologia


"Nootrópico" ("noos" = mente e "tropéin" = atração por) é uma palavra moderna, cunhada na década de 70. Os nootrópicos são medicamentos ou suplementos que são capazes de aumentar o desempenho cognitivo de seus consumidores – em geral, estes são pessoas que padecem de Mal de Parkinson ou de Alzheimer. 

No entanto, aqueles que não sofrem de doenças neurodegenerativas acabam se interessando pelos nootrópicos, uma vez que eles anunciam a capacidade de melhorar a concentração, memória, percepção e até mesmo proteger o cérebro de danos químicos e físicos.

Para entender um pouco mais sobre os nootrópicos, é necessário voltar um pouco no tempo e visitar a Romênia do século XX. Foi lá que foi produzido o primeiro nootrópico, o Piracetam.


Conheça Corneliu E. Giurgea, o pai dos nootrópicos


Corneliu E. Giurgea
A síntese do primeiro nootrópico, o Piracetam, nada tinha a ver com a busca de uma droga que fosse capaz de aumentar a inteligência. Pelo contrário. O doutor romeno Corneliu E. Giurgea (1923 – 1995), mesmo vivendo num mundo marcado pela lógica bipolar da Guerra Fria, ele esteve dos dois lados da Cortina de Ferro. Viajou um bocado tanto pelo mundo capitalista quanto pelo comunista. 

Foi educado na Romênia, onde, na Universidade de Bucareste, recebeu um Ph.D. em Medicina. Depois de uma passagem pela Rússia e um pós-doutorado nos Estados Unidos, o doutor Giurgea chegou onde essa história realmente se passa: nos laboratórios da indústria farmacêutica belga UCB (Union Chimique Belge).

Na época, o conhecimento sobre o neurotransmissor GABA (ácido gama-aminobutírico) era muito recente. Só em 1950 que ele foi reconhecido como parte do sistema nervoso central dos mamíferos. A descoberta de que o GABA tinha efeitos sedativos, porém, criou uma verdadeira corrida a fim de criar um medicamento com a estrutura química semelhante a ele. 

A corrida em busca de uma nova droga
Já que o GABA não é capaz de cruzar a barreira hematoencefálica, era necessário sintetizar uma droga que fosse capaz de chegar ao cérebro e que "mimetizasse" o GABA. A hipótese era seguinte: se fosse sintetizada uma molécula com estrutura semelhante à do GABA, ela se ligaria aos mesmos receptores de membrana que o GABA. Esperava-se, assim, produzir, uma droga com efeito calmante e que combatesse a ansiedade.


À esquerda, Piracetam. À direita, GABA

Em 1964, junto com sua equipe da UCB, o doutor Giurgea sintetizou uma molécula bem parecida com o GABA: a estrutura era muito próxima, apenas com a substituição de alguns grupos moleculares e a formação de uma estrutura cíclica. 

UCB 6215: fazendo uma limonada a partir do limão
No entanto, a surpresa foi que UCB 6215, ou Piracetam, tal como foi chamada a nova molécula, não produzia efeito sonífero algum. Giurgea e sua equipe perceberam que tinham acreditado numa hipótese incorreta. Os derivados de GABA não produziam "inibição" extra na condução de impulsos nervosos.
           
Produto estrangeiro com piracetam alega
que a substância
"ajuda na memória, na concentração, e
no bem-estar geral; além de reduzir o estresse
e a fadiga"
Ao invés de se prostrar diante do fracasso da empreitada, Giurgea decidiu transformar seu erro num sucesso. Testes clínicos em animais mostraram que Piracetam era eficiente para inibir nistagmo (movimento involuntário dos olhos), vertigem (distúrbio de equilíbrio, descrito como "uma tontura rotatória") e, o que era mais interessante: em ratos, não se mostrava tóxico. 

Diante desses resultados, Giurgea conseguiu a aprovação para estudar o Piracetam em humanos.

A pílula da inteligência: capaz de fazer "pensar melhor"
É aí que a história mudou totalmente de rumo. Como já era de se esperar, o piracetam também reduziu ou eliminou os sintomas de vertigem em humanos. Só que a droga surpreendeu os cientistas quando os participantes do estudo notaram um "efeito colateral" interessante. 

Os pacientes diziam "pensar melhor" após a administração de Piracetam. A administração de doses frequentes não demonstrou nenhum efeito tóxico. 

Tais relatos foram suficientes para que um outro cientista da UCB, Dr. Sorel, realizasse um estudo de Piracetam em crianças que tinham epilepsia. Piracetam não só mostrou-se eficaz para combater a frequência de convulsões, como também pacientes e suas famílias relataram "melhorias na capacidade cognitiva geral".

O Nootropil chega às farmácias
Piracetam foi comercializado como
"Nootropil" e garantiu sucesso para a
Union Chimique Belge
Poderia ter sido uma grande decepção para a UCB, mas, na verdade, foi o que garantiu a companhia farmacêutica enorme fama na Europa (a UCB é, atualmente, uma multinacional). Piracetam chegou às prateleiras das farmácias europeias em 1971. Foi um sucesso de vendas por um motivo inusitado: o doutor Giurgea tinha criado uma espécie de "melhorador cerebral". 

Nem sedativo, nem estimulante tal como a cafeína. Era algo completamente novo, e, portanto, não se encaixava em nenhuma dessas definições. Como se não bastasse, era uma substância que não causa vício, nem era tóxica.

Efeitos cumulativos

Um estudo, em 1976, contou com voluntários universitários jovens e saudáveis. Nesse grupo, parte recebeu um placebo e outra parte, Piracetam. A conclusão final foi bem clara: estatisticamente, Piracetam melhorava a memória, eficiência mental e inteligência. 

Mas, assim como nos estudos do Dr. Sorel em crianças com epilepsia, houve uma segunda conclusão: os efeitos de Piracetam não eram imediatos. A droga tinha, sim, efeitos cumulativos e era a administração consistente que lhe garantia tais efeitos cognitivos benéficos.

O que são nootrópicos, segundo Giurgea

Criava-se uma nova classe de drogas outrora inexistente. Foi o próprio cientista romeno, Giurgea, quem deu o nome: nootrópico (do grego, algo como "voltado/com afinidade pela mente"). Ele criou vários critérios para classificas os nootrópicos:
  1. As funções de memória e de aprendizagem devem ser significantemente melhoradas pelo nootrópico.
  2. As habilidades físicas para performar as tarefas aprendidas devem ser melhoradas.
  3. O nootrópico deve proteger o cérebro de estresses físicos ou químicos.
  4. Nootrópicos devem ter efeitos colaterais insignificantes.
  5. Nootrópicos não devem ser tóxicos ou causar dependências.

9 comentários:

  1. gostaria de saber mais sobre esse medicamento. entre em contato assim que possivel... obrigado..
    torres.gabriel156@gmail.com

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  2. le todo seu artigo sobre Noopept e estou pensando em comprar! gostaria saber se voce tomou de verdade o medicamento e se lhe causou algum efeito colateral...

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    1. Gabriel, eu não usei o Noopept (por enquanto!). O Noopept é descrito como 1000 vezes mais forte que o piracetam. Eu não sei se essa alegação tem alguma validade científica, mas trata-se de um nootrópico com efeitos bem mais profundos e notáveis pelo o que eu li em fóruns estrangeiros. Assim que eu tiver o Noopept em mãos, irei falar sobre ele também.

      Já com o piracetam, eu sempre tive resultados satisfatórios e nenhum efeito colateral sério ou persistente. No entanto, essa foi apenas minha experiência. Recomendo que você converse com um médico antes de comprar.

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  3. Oi Matheus tudo bem?? qual dosagem vc tomava piracetam? estou a tomar a dois dias e até agora não percebi diferença. estou tomando duas vezes ao dia 800mg

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    1. Itamar, são poucos os estudos científicos que investigam o uso do piracetam apenas para melhora cognitiva em quem é saudável. No entanto, mais de um desses chegou à mesma conclusão: a dose ótima é de 4800 mg por dia. Deixo as referências:
      https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10555876
      http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8272204

      Minha recomendação é que não se automedique e converse com um médico antes. Você também pode ter interesse no Noopept, uma versão análoga ao piracetam que é mais barata e requer doses muito menores: http://cerebroturbinado.blogspot.com.br/2015/11/noopept.html

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  4. Mas vc toma piracetam, tem algum problema de memória? Eu sou saudavel e to afim de tomar

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    1. O piracetam é indicado para vários fins terapêuticos, mas muitos pessoas saudáveis o usam de modo "off-label" com o objetivo de melhorar as funções cognitivas. Esse uso deve ser avaliado, prescrito e orientado por um médico.

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  5. Em outras palavras quantos comprimidos recomenda se tomar por dia , seriam seis por dia ? grato
    slc3405@hotmail.com

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  6. Qual a dosagem ideal para quem ter pequenas percas de menorias.

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